A informática e internet impulsionaram a sociedade contemporânea a produzir grandes avanços tecnológicos, científicos e socioculturais em curto espaço de tempo e com grande repercussão para o progresso da humanidade.
Entretanto, com o avanço tecnológico também surgem novas problemáticas relacionadas ao novo modelo cultural institucionalizado na chamada sociedade tecnocientífica do século XXI, como os crimes cometidos através da informática e internet, denominados como crimes cibernéticos.
Os primeiros crimes relacionados ao uso da informáticos pelos humanos foram praticados já no início da criação dessa tecnologia, em meados de 1960, nos Estados Unidos. A partir dos anos 1980, com o avanço da informática em larga escala e para consumo em lares, não apenas para uso profissional, os crimes digitais se intensificaram, sendo os principais delitos cometidos na época a pirataria de programas de computação, manipulação de dados bancários, ilegalidades nas telecomunicações e pornografia infantil.
Ao avançar das tecnologias da computação produzidas ao longo da segunda metade do século XX e início do século XXI, as modalidades criminosas no âmbito da informática e internet também se aprimoraram, além de cresceram de forma vertiginosamente, em razão da possibilidade de cometimento de crimes ultrapassando as fronteiras físicas dos lares dos usuários da tecnologia e com anonimato na prática.
Nesse contexto, com o advento da globalização que dominou o modo sociocultural e econômico no final do 1990 e início do novo milênio, o Brasil adotou políticas públicas para expansão da informática e internet nos lares da população brasileira, o que consolidou o uso da internet como meio de integração social e cultural, bem como se tornou fonte de desenvolvimento econômico no país. Conforme pesquisa Ibope/NetRatings, em 2007, o Brasil possuía cerca de 18 milhões de usuários residenciais e já movimentava a cifra de 114 bilhões de dólares em comércio eletrônico.
Diante desse cenário, os crimes cibernéticos ganharam robustez e sofisticação, gerando prejuízos bilionários aos usuários, bem como novas modalidades de crimes surgiram com a criação das redes sociais: os crimes sexuais e de honra e imagem cometidos no âmbito digital.
No Brasil, a partir da popularização das redes sociais na Internet, por volta nos anos 2006, começaram a eclodir casos de violação de intimidade, imagem e honra dos usuários, através do compartilhamento de fotos sensuais nas mídias de relacionamento. Até então, os crimes cibernéticos não tinham previsão legal no ordenamento brasileiro, daí surgia a dificuldade de enquadrar os criminosos no tipo penal da legislação então vigente, pois a Internet é um campo de difícil acesso para os profissionais do Direito, então como proceder diante desses crimes?
Foi então que, diante crescimento exponencial de demandas judiciais de violação de intimidade perante o Judiciário brasileiro, impulsionado por um crime cometido em face da atriz Carolina Dieckmann, que tem um apelo midiático e social gigantesco em 2011, quando ela foi vítima de um grupo de hackers que invadiram o seu computador pessoal e divulgaram fotos íntimas da atriz, que em menos de um ano, por volta de novembro de 2012, fora promulgada a primeira lei nacional que classificava e punia os crimes cometidos no cenário digital, Lei nº 12.737/2012, apelidada de Lei Carolina Dieckmann, por tamanha repercussão que o caso da atriz trouxe acerca dos crimes cometidos com uso da informática e internet.
A Lei nº 12.737/2012 dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos, alterando o Código Penal brasileiro para inclusão dos seguintes crimes relacionados ao uso da informática e Internet :
“Invasão de dispositivo informático
Art. 154-A. Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
§ 1º Na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput.
§ 2º Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta prejuízo econômico.
§ 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.
§ 4º Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidas.
§ 5º Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra:
I – Presidente da República, governadores e prefeitos;
II – Presidente do Supremo Tribunal Federal;
III – Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou
IV – dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.”
“Ação penal
Art. 154-B. Nos crimes definidos no art. 154-A, somente se procede mediante representação, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos.”
Art. 3º Os arts. 266 e 298 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública
Art. 266.. ……………………………………………………………..
§ 1º Incorre na mesma pena quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o restabelecimento.
§ 2º Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública.” (NR)
“Falsificação de documento particular
Art. 298.. .......................................................................
Falsificação de cartão
Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de crédito ou débito.” (NR)
A Lei Carolina Dieckmann inaugurou o processo regulatório da Internet no Brasil. Diante dos crimes e demais demandas relacionadas ao cenário da informática e Internet no território brasileiro, o Congresso Nacional em 2014 aprovou o Marco Civil Regulatório da Internet, através da Lei nº 12.965/2014, cujo conteúdo legislativo se debruçou na normatização dos direitos e deveres dos usuários das redes. Posteriormente, fora criada a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD, que regulamenta o tratamento dos dados pessoais dos usuários brasileiros nos meios físicos e digitais, visando a proteção da liberdade e privacidade dos indivíduos.
Nesse cenário, o Brasil avançou na criação de dispositivos legais para o combate aos crimes cibernéticos, tendo em 2021 aprovado a Lei nº 14.155/2021 para alterar o Código Penal mais uma vez, com a finalidade de tornar mais graves os crimes digitais.
Entretanto, apesar do ordenamento jurídico brasileiro dispor de regulação e punição no âmbito digital, os crimes virtuais no Brasil crescem em uma proporção impressionante, visto que há inúmeras alternativas criminosas no mundo digital, não restando suficiente a legislação e fiscalização brasileira, em face do aprimoramento contínuo das tecnologias criminosas.
Nesse sentido, estudo realizado pela FortGuard Labs concluiu que o Brasil registrou no primeiro semestre de 2022 mais de 31,5 bilhões de tentativas de ataques cibernéticos a empresas, 94% superior as tentativas de ataque hacker do primeiro semestre de 2021, que restaram na faixa de 16,2 bilhões de tentativas.
Em razão do avanço e aperfeiçoamento dos crimes cibernéticos, em 2018 fora instituída Política Nacional de Segurança da Informação – PNS, com a finalidade de garantir segurança cibernética nos dados das organizações públicas e privadas , de modo a coibir os crimes nessa esfera, como o mais recente golpe cibernético, denominado ‘ransomware’, um vírus de computador que sequestra dados dos usuários e pede dinheiro para que a vítima consiga resgatar seus dados. A grande dificuldade em identificar o autor desse crime é que a modalidade de acesso dele é criptografada, ou seja, não é concebível o rastreamento, bem como a forma de pagamento exigida pelos bandidos é a criptomoeda, o que dificuldade de sobremaneira a localização das ações criminosas.
Portanto, é necessária permanente vigilância do usuário das redes na utilização da informática e Internet, de modo a sempre dispor de mecanismos tecnológicos de prevenção aos crimes digitais, bem como agir com precaução no acesso de dados fornecidos por sites desconhecidos e através de redes anônimas, buscando está atento as novas alternativas de delitos virtuais veiculadas pela imprensa para evitar ser vítima de crimes cibernéticos.
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